Cola cum Fróis

Escrevo pela necessidade de me livrar das palavras | @_dudufrois

sábado, 29 de março de 2014

Março de Cinzas

Choveu...

Lá se vai outro carnaval que escorre pelas mãos do presente, e vira recordação. Consigo ele leva Março, um mês de recomeço, de início real do ano. Ano este que é longo; repleto de comemorações, acontecimentos e eventos importantes. E que só vai acabar de fato quando Março chegar outra vez. A partir daqui, meu tempo se encurtará mais, minha rotina muda, mas a presença no Sessão sempre será constante.

Como sou um rapaz muito organizado (hahaha), dividi o post em dois. Agora, com as justificativas das notas dos jurados das duas cidades sambísticas saindo quase juntas, ficou mais fácil. São Paulo; que eu vi os desfiles do chão, tirei minhas conclusões baseadas no que EU mesmo estava acompanhando. Rio de Janeiro; que eu acompanhei de longe e tentei traçar uma linha geral do que eu vi por aí.


São Paulo:

E Choveu pra caralho!

A Leandro de Itaquera entrou no Anhembi debaixo duma chuva muito forte. Chegou a chover granizo. Claro que isso comprometeu o desfile, mas não o diminuiu. A escola passou vibrante e alegre. Porém, apresentou muito erros. O samba não ajudou. A chuva que deu na Leandro, parou pra Rosas passar. A escola elevou o nível plástico e rítmico dos desfiles. Tinha uma batucada perfeitinha. Mas o enredo nada empolgou. Aí a chuva voltou. Mais forte. O granizo também voltou. Entrava naquele portal a X-9 Paulistana. O luxo aumentou. A empolgação murchou. O samba melhorou. E a chuva esfriava os componentes. Até que ela deu uma amenizada, mas não parou. A Dragões entrou firme, trouxe um tema de fácil identificação e bem alegre. Sem nuances nem maiores surpresas. Passou correta. Ainda debaixo de garoa, entrou a Tucuruvi. Alegre. Também passou correta. O samba não funcionou. O enredo começou a se tornar cansativo, e a escola foi perdendo o pique (ou levando o meu embora). Depois, foi a vez do Vai-Vai desfilar. Foi a primeira escola que pareceu realmente não se importar com a chuva. Teve um bom chão, mas o que atrapalhou a apresentação foi a parte plástica, que estava bem aquém dos moldes bixiganos (existe esse predicado?). Logo em seguida, já de manhã, a Tom Maior também pareceu não se importar com a garoa que caía. Pareceu não se importar também com o problema que ocorreu no carro-abre alas, e desfilou de maneira leve, brincando realmente o carnaval. Talvez o melhor desfile da noite em termos de "valeu meu ingresso". Acho que era aquele samba...


Início da passagem da Tom Maior, última escola da sexta.

No Sábado, a chuva deu uma trégua para a Pérola Negra passar. E não retornou. A escola trouxe um belo enredo, um belo samba, belas alegorias, fantasias, uma bateria repleta de convenções; porém pecou no principal, empolgação. Em seguida, a Gaviões da Fiel preencheu o que faltava na Pérola. Mas teve bastante erro. O enredo, não empolgou como previsto, e algumas falhas de comunicação na harmonia da escola fez com que eles apertassem o passo. Sendo a terceira da noite, a Mocidade Alegre entrou como campeã. E saiu como campeã. Tendo, simplesmente, o melhor samba do ano, fica tudo mais fácil. Além do que, a comunidade do Limão sempre eleva o patamar da escola. Aliás, comunidade que cantou de joelhos, serviu como o destaque deste carnaval. Logo após então, a Nenê adentrou a passarela do Anhembi. Não conseguiu manter o nível plástico, muito menos o nível de samba, da escola anterior. O que realmente marcou na passagem da azul-e-branca foi a uniformidade do canto, dando um efeito de "escola-solta". Aí veio a Águia de Ouro. O nível do samba subiu outra vez. A escola rasgou o chão, manteve o bom nível de harmonia que se estendia por aquela noite. Só não saiu como campeã, porque desfilou depois da Mocidade. E praticamente no mesmo nível, chegou a Império de Casa Verde. Ficando pra trás apenas em samba, o tigre mostrou que também brigaria pelo título (se fosse um julgamento justo, rs). O nivelamento das agremiações estava lá no alto. Até que o Tatuapé chegou pra encerrar a festa. E fez aquele desfile de lavar a alma. Com um samba (muito mal julgado, por sinal) que soava como um hino, misturando-se ao raiar do dia, a agremiação emocionou a todos com seu enredo. Pode ter ficado abaixo das melhores escolas em questão de requinte, mas, com certeza, correu atrás nos outros quesitos. Pena que problemas com a evolução da escola na pista a tiraram da briga. Mas que era um samba memorável, era...

Tatuapé, encerrando o carnaval do Grupo Especial paulista.

No domingo de Acesso, quem abriu os desfiles foi a Colorado do Brás. E abriu como escola grande. Trouxe um bom número de componentes, e o mais importante, componentes que cantavam. O enredo deu uma alegria a mais ao desfile. Em seguida, era a vez da Morro da Casa Verde. Com um tema curioso, a escola soube trazer boas sacadas. Só não se saiu melhor por ter um samba muito "preso", longo. Aí, a Unidos do Peruche entoou seu belo samba. Fez uma apresentação bonita, sem ficar devendo pra nenhuma das que desfilaram. Finalmente, despontando como destaque, surge o Camisa Verde e Branco, cantando o berço do samba. Fez um desfile único. Repleto de emoção e de ritmo. Posteriormente, Imperador do Ipiranga desfilou seu carnaval. Foi outra bela apresentação, que também soou como leve na passarela. Logo depois, foi a vez da Vila Maria, que não tinha um samba tão bom, mas compensou no visual. A comunidade também chegou junto, fazendo aquele coro na avenida. Enfim, a Mancha Verde fez o desfile da noite. A redenção do carnaval, renasceu das cinzas pra emocionar geral. De alegoria, passando por bateria, chegando em samba. A escola simplesmente sobrou. E por fim, pra manter a tradição 2014ziana de encerrar as noites com sambas fodas, veio a Terceiro Milênio. A escola começou lá em cima, mas caiu muito ao longo da avenida. O canto e bateria diminuíram bastante sua intensidade. Mas aquele samba ficou na minha cabeça, não tem jeito...

Mancha Verde, fazendo do Domingo, especial.

Na segunda eu até compareci ao Anhembi. No entanto, como não assisti a todas as escolas que desfilaram (e as que eu vi, eu não prestei tanta atenção pois estava morrendo de fome/sono/frio/dor de garganta), não poderei falar sobre. Apenas digo que na UESP, deveriam sim subir DUAS escolas, pois num grupo recheado de agremiações que lutam em prol do samba, é sacanagem fazer 10/12 escolas disputarem apenas uma vaga. O acesso comporta mais escolas! O Grupo 1, não.

E como carnaval é uma disputa muito séria, encerro São Paulo dando minha sincera opinião sobre a apuração e o julgamento do evento como um todo. São vários quesitos que, pra mim, estão muito mal julgados. Acho que isso é mais culpa da LIGA do que dos próprios jurados. E não pode seguir ocorrendo de carnaval em carnaval. O sambista não merece isso...


Alegorias e Fantasias: foram julgadas apenas com os erros. "Se errou, desconta!" Concepção, adequação, criatividade; não existe, né? Ou então, todas escolas passaram perfeitas nisso e eu que enxerguei coisa de mais.

Comissão de Frente, Bateria e Mestre Sala e Porta Bandeira: estão sendo analisados cada vez de forma mais técnica. Isso prejudica um pouco a magia dos quesitos, que é agradar ou não. Sem contar o absurdo que é ver jurado descontando ponto por cuíca e pandeiro; sem ao menos levar em conta o ritmo todo da Bateria (os instrumentos obrigatórios), que em si é o que ele deveria analisar. Absurdo ver jurado dividindo MSPB em dois, tirando ponto de fantasia. Absurdo não considerar Comissão de Frente e ala coreografada como componentes que devam cantar o samba. Absurdo julgar a comissão de frente dando 10 pra quem cumpre o que tá escrito, e só tirar ponto do que cai no chão, do que apaga na avenida. Mais uma vez; criatividade, concepção... não existe nada disso no carnaval de São Paulo?

Enredo e Samba-Enredo: que são vistos como "cumpriu ou não a proposta". Não levam em consideração a qualidade do enredo/samba, sua criatividade, seus pontos fortes. Mais uma vez, só descontam do que "faltou", do que "não se encaixou". Um samba é maior do que isso. Bem maior!

É como eu postei no face, não há expectativa de melhoras. Fazer o que, a gente quer o bem do samba. A gente quer um carnaval justo. A parte complicada é que cada um viu uma coisa diferente, numa situação diferente, dum momento diferente. Fora esse sistema de notas decimais que traz de volta aquele tempo em que as notas variavam de 0 a 10, não podendo ser quebrada. Isso só faz com que os jurados descontem pouca coisa de erros que deveriam ter um peso maior. Dá a impressão ilusória de uma disputa acirrada, na qual na verdade as notas apenas variam "0,1". Enfim, o problema maior é interno. É o modo como tudo isso funciona, que é pra cumprir regulamento. Acho que a mudança fundamental seria no regulamento. Mas o que esperar de um sistema de notas que exclui um quarto das notas atribuídas por não confiar na índole dos seus representantes?

Rio de Janeiro:

Do Rio, pelo pouco que eu olhei, o julgamento pareceu ser bem mais sério. Notas justificadas realmente. Poucos "dez" dados de graça. Lá, se está ruim eles tiram ponto mesmo. Aliás, se está bom também tiram as vezes (principalmente se for ponto do Império da Tijuca). Os jurados de lá são mais experientes. Isso tem um peso bem maior. Parece que lá eles sabem julgar "melhor" um desfile. Não que eles não errem também, longe disso (vide o resultado deste ano, rs). Mas a discrepância entre as notas dadas e o desfile apresentado é bem menor. Pelo menos na maioria das vezes sim (salvo exceções como as alegorias da Vila). Lá a tradição do carnaval é maior, isso pesa muito. Aqui, parece que ainda estamos nos ajustando. Não se ajustando aos moldes de lá, se não bastava copiá-los, mas ajustando ao nosso. Se os cariocas não estão contentes com os jurados deles, nós muuuuuuuuito menos com os daqui. Acho que o problema principal do Rio (e que também ocorrem em Sampa) é avaliar a escola pelo porte, coisa que eu nem vi tanto esse ano. A Liga paulistana deveria observar melhor como são treinados os jurados e planejado o manual de julgamento de cada carnaval carioca. Assim como, o carnaval do RJ no geral, deveria aprender mais com a organização técnica do evento de SP como um todo. Melhorias na forma como é realizada a festa são sempre válidas para preservar nosso samba brasileiro.

A respeito dos desfiles, como vi tudo "por cima", não vou comentá-los. Vou apenas dar um panorama conjunto do que eu achei dos sambas, do que me marcou:

                                                  A Águia mais tradicional do carnaval, altaneira, voando baixo.

O chão tremeu. Assim como Itaquera tremeu, a Formiga também tremeu. A Tijuca tremeu. E com ela toda a Sapucaí. O batuque foi de bamba, firme, bem marcado e cheio de ginga. Axé! Axé, que o mar de Iemanjá deslizou na orla de Maricá. O homem voou novamente. Explodiu. Contrastou com a calmaria do barquinho que navegava. Daqui pra lá. De lá pra cá. De Caxias pra Zona Sul. Da praia pro morro. Do asfalto pra favela. O sonho humilde, tão rico, subiu a pirâmide social. Venceu preconceitos. E bateu de frente com o mais puro samba. Tendo batucada lá, e no Brasil inteiro. O coração-mandão viajou pelo país. Cantou. Dançou. Festejou. Pulou até fogueira. Mas não deixou de cair no samba. Samba autêntico. Aquele vindo lá da África. Sutil e preciso em seus versos. Samba que clamou esperança e consciência. E quem diria, tocou aquele coração-mandão. Espalhou sabedoria, boas energias. Ensinou. Aprendemos. Preservamos, pra não virar notícia ruim. Praquele sonho anterior, continuar vivo pro sonhador. E ecoar ao mundo. Sem máscara, sem manipulação, sem mídia desonesta. Clarear a informação. Ecoar a verdade pura. Comunicando-se com o povo. Com a natureza. Em harmonia... Seja no Rio ou em Pernambuco. Porque somos todos mamelucos. Independente de cor, sexo ou crença. Somos brasileiros. Somos apaixonados. Temos a nossa identidade. E desde pequeno cirandamos a cerca dela. Volta e meia o que nós fomos, volta ao presente. Nos surpreendemos. Nesse universo infantil tão rico, infelizmente um dia saímos da ilusão. Perdemos a inocência. Mas mantemos o tesouro. Dentro do coração, que hora mandão, sempre sabe o que diz. Disse uma vez e diz outra: preservação. Pro Brasil. Pro mundo. Ele sabe o que fala. Ele é natural. Ele vive em harmonia com a natureza. Em harmonia com todas as culturas. Sábio coração. Com ou sem suporte adequado, temos que respeitá-lo. Ainda mais no país do futebol. Onde um menino sonha em virar rei pela bola. Raramente consegue. Ás vezes morre com o sonho na mente. Ás vezes sai da ilusão, e vence na vida. E quando vence, tem que brindar mesmo! Comemorar feito gol. Porque no Rio; no Rio há várias histórias dessa. Sempre houve. Não só no Rio. De mar à mar. No mundo. É a vida botando-abaixo sonhos nem sempre alcançados. Ficam no passado. Guardados lá atrás. Mas é daí que surge a vitória. O triunfo. Da adversidade, voamos. E do alto enxergamos a glória. Mesmo que ela não dure muito, vale a pena quando a saboreamos merecidamente. Nunca vamos nos conformar, mas quem somos nós para julgar alguém? Construiu-se o sonho na Sapucaí. E ele foi vencido. Com direito a champanha e tema da vitória. Parabéns a todo mundo que participou dele. E quem me dera sonhar por mais um minuto...

Apesar de tudo, obrigado Março!

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