Traguei o baseado, matei a cerveja e deixei a ponta de lado, ali memo onde eu tava sentado. Na praça algumas crianças brincavam, suas mães ali perto, um morador de rua descansando atrás de mim, vários catadores de latinha e os jovens universitários que se divertiam, gastavam grana e usavam suas paradas ao livre. Reparei numa menininha vidrada na tela do celular da mãe. Ela chegou bem pertinho de mim, andando e olhando pra tela, devia estar jogando, distraída, nem percebeu os meus olhares. Assim como eu nem tinha percebido o lance do gol do time equatoriano.
Um silêncio tomou conta do entorno da praça. Poucas comemorações de torcedores rivais. E, na parte que eu tava, a galera parecia bem mais focada em dançar, beber, fumar e girar bambolê. Não colei lá no meio, fiquei de canto, mas deu pra ouvir quando a mestre de cerimônia pegou o microfone para informar às pessoas sobre o assassinato de Marielle Franco e seu motorista Anderson Pedro, no bairro do Estácio, quando voltavam do evento 'Jovens Negras Movendo as Estruturas'.
O carro em que eles estavam foi alvejado por ao menos nove disparos, todos em direção de Marielle, no banco do carona. Socióloga por formação e cria de favela, ela foi a sexta vereadora mais votada nas últimas eleições municipais do Rio de Janeiro com 46,5 mil votos, pelo PSOL. Recentemente, Marielle havia assumido o cargo de relatora da comissão da intervenção militar na câmara municipal. Ela também havia denunciado o abuso de poder do 41o batalhão da PM, já conhecido pela violência nas operações policiais, que no último sábado matou 2 jovens na favela do Acari.
- Foi mais uma mulher negra assassinada nesse país!
A notícia da execução cortou a energia do baile. E a minha também. Poucas pessoas ainda dançavam quando Vinícius Junior entrou no jogo fazendo sua estréia na principal competição do futebol sulamericano. Logo num dos primeiros ataques o menino vinha marcado carregando pela direita, quando chegou na entrada da área puxou pra dentro, tirou de um, tirou de outro, bateu e a bola ainda desviou na zaga antes de ir parar no fundo das redes. Um golaço que eu só fui ver no replay.
De instinto me levantei. Fui ver de perto o que tava acontecendo. Queria saber do lance, como foi a jogada do gol. Parei pra ver a partida, que ficou mais corrida, com mais chances de gol. Vi Dourado perder uns dois gols de cabeça. Depois, num contra-ataque, Diego só ajeitou pro Vinícius bater novamente de esquerda, dessa vez sem desvio, e carimbar a vitória fora de casa. O moleque é bom mesmo.
MARIELLE VIVE!
O carro em que eles estavam foi alvejado por ao menos nove disparos, todos em direção de Marielle, no banco do carona. Socióloga por formação e cria de favela, ela foi a sexta vereadora mais votada nas últimas eleições municipais do Rio de Janeiro com 46,5 mil votos, pelo PSOL. Recentemente, Marielle havia assumido o cargo de relatora da comissão da intervenção militar na câmara municipal. Ela também havia denunciado o abuso de poder do 41o batalhão da PM, já conhecido pela violência nas operações policiais, que no último sábado matou 2 jovens na favela do Acari.
- Foi mais uma mulher negra assassinada nesse país!
A notícia da execução cortou a energia do baile. E a minha também. Poucas pessoas ainda dançavam quando Vinícius Junior entrou no jogo fazendo sua estréia na principal competição do futebol sulamericano. Logo num dos primeiros ataques o menino vinha marcado carregando pela direita, quando chegou na entrada da área puxou pra dentro, tirou de um, tirou de outro, bateu e a bola ainda desviou na zaga antes de ir parar no fundo das redes. Um golaço que eu só fui ver no replay.
Alô Tite, o garoto é brabo!
- Chama ele, Tite! Melhor que o Taisson!
A galera flamenguista do bar riu. Até concordaram. Eu fui tentar acender um cigarro e não achei meu bic, nem tinha mais vontade de continuar por lá, até tocar o Afro Rep do Rincon Sapiência. Pedi um isqueiro emprestado. Se pá eu até avistei o Choice e Coruja BC1 de role ali na Cantareira. Dei um tempo curtindo a música que rolava mas aquela fita da Marielle tava entrando na minha mente. Mano... E se fosse minha mãe, minha vó, minha mina?
Porra, nem no mês das mulheres uma militante da causa social na política tem sossego no Brasil, onde o feminicídio mata oito por dia. Também, né... Além de ano de copa, 2018 é ano de eleição. E Marielle era uma ameaça pro conglomerado de poder que se estabelece nesse sistema sanguinário. Eles não querem mudança, renovação. Eles querem a quebrada e a pista do jeitinho que tá, porque assim funciona. Pelo menos pra eles.
Não pra nós, irmão. 15 milhões de desempregados, segundo o vendedor de balinha no ônibus que eu peguei indo pra São Gonçalo, um dia desses. Acuados pelo poder bélico do poder público que se diz em nome da segurança. Uma (falsa) segurança seletiva. Só que a galera da praça parecia mesmo estar mais preocupada com a vitória de virada do Mengão na Liberta, justamente o seu time do coração. Afinal, nesse país todo dia morre uma mina preta de quebrada.
Marielle resiste. Filha de Yansã e Obaluayê, essa guerreira não terá sua passagem esquecida. Assim como tantas outras mulheres de periferia que tiveram suas vidas interrompidas brutalmente. O assassino dela e de seu motorista precisa pagar na justiça pelo que fez. E a investigação deste caso deveria esclarecer o(s) real(is) mandante(s) por trás desta execução cruel. Pois de que vale um título de grande expressão no futebol, se neste país a liberdade é silenciada por meio da bala?
Marielle sempre presente!
Marielle sempre presente!
Descanse em paz, M.F
aqui a luta continua.
aqui a luta continua.