Tendo a escadaria da grandiosa Catedral Metropolitana de Florianópolis como ponto de encontro para a saída de campo duma disciplina que eu tô cursando, já voltei a mente pra influência histórica da religião católica sobre a formação das cidades brasileiras. Só que além de receber missas, casamentos e celebrações religiosas; e se tornar um ponto turístico, a catedral também virou uma espécie de marco social onde as pessoas se encontram, vão para o local para verem e serem vistas; marcam encontros, atos, protestos e até mesmo aulas de antropologia.
Catedral Metropolitana de Florinópolis
Talvez pela grandiosidade da obra arquitetônica, as suas escadarias se tornaram referência geográfica da capital catarinense. Assim como a Praça XV, que se localiza logo em frente da igreja. Cenário da passagem apressada diária de milhares de pessoas, o local também é ocupado e, portanto, possui suas características particulares de público. Por lá é comum encontrar o espaço das barraquinhas de comida e artesanato, mais próximo à catedral; o espaço dos idosos que passam o dia jogando baralho e dominó, também próximos à igreja; o espaço dos moradores de rua, mais espalhados ao longo da praça, que se misturam com turistas e trabalhadores do centro que vão se refugiar ali; e os diversos tipos sociais que se encontram e se integram em meio ao centro histórico de uma cidade de quase meio milhão de habitantes. O espaço de cada um desses grupos sociais não é demarcado visualmente, mas habita o consciente coletivo de cada conhecedor do local.
antiga Casa de Câmara e Cadeia
Caminhando então pelos lados da Casa de Câmara e da Cadeia antiga, que hoje estão em reforma, a população vai se diversificando em cores e idades. Por se tratar de horário comercial, e aquela região abrigar muitos escritórios, o vai e vem de pedestres e carros é intenso pelas ruas estreitas. A localização dos chamados cursinhos pré-vestibular contribui para o fluxo. Porém, a vida ao longos dessas ruas dura conforme o horário comercial. Após o expediente a região vai ficando vazia, já que não existem grandes condomínios residenciais, e os prédios, mais antigos, não têm, em sua maioria, estacionamento e mais do que dez andares. O interessante é saber que uma ruela em especial da região ganha sobrevida à noite devido a concentração de bares: é a Travessa Ratclif. Ela atrai sobretudo jovens e pessoas que saíram do trabalho e vão para lá fazer o chamado “happy-hour”. Além disso, o local também é frequente palco cultural de sarais e apresentações regionais, dentre elas uma tradicional roda de samba da ilha.
Travessa Ratclif
Do outro lado da praça podemos notar com nitidez a diferença entre o passado histórico - e sua busca pela preservação - e a contemporaneidade. Nos prédios enxergamos antigas construções, com os traços da arquitetura europeia que colonizou a cidade. No entanto, nos mesmos prédios, na parte do solo, no qual é feito o contato direto com a população que por lá circula, vemos a apropriação atual do comércio de grandes franquias de lojas sobre o patrimônio histórico. Ou seja, num enquadramento distante, quase que panorâmico o centro da cidade aparece como que em sintonia com as raízes culturais de sua colonização. Entretanto, ao aproximar o olhar para a visão de um consumidor comum - seja ele morador ou turista - o que vemos não são mais elaboradas construções; e sim banners, anúncios, letreiros e placas de ofertas das diversas lojas ali instaladas.
o novo Mercado Público
Rua Vidal Ramos
feirinha do Largo da Alfândega
Voltando para o terminal de ônibus trombamos a feirinha da Alfândega, que é onde a circulação de pessoas é mais intensa, diversificamos ao máximo o nosso contato com as pessoas. Entregadores de panfletos são comuns. Seu conteúdo vai de puteiros à cursos de capacitação profissional. Abordagens por ali também são frequentes. Distrações, muitas vezes com o celular, em meio a aglomeração, podem interromper o intenso fluxo contínuo. Desde ambulantes até vendedores de chips das maiores operadoras de celular. O comércio de pequenos acessórios artesanais também é numeroso e é feito em sua maioria por estrangeiros.
De resto, é o andamento do contingente natural da cidade de Florianópolis. Engravatados quase que se esbarram em andarilhos. Estudantes bem-humorados contracenam com turistas curiosos... As estreitas ruas do centro histórico são barulhentas por isso. Conversas, pessoalmente e no celular, anúncios e o barulho de passos se entrelaçam, deixando quase que imperceptível o som dos carros não-tão distantes. Música as vezes faz parte do som ambiente, onde artistas vão fazer da calçada apertada de cada dia de trabalho o seu palco.